Resenha - A Rainha Vermelha (A Rainha Vermelha,Vol. 1)


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Autora: Victoria Aveyard

Editora: Seguinte

Páginas: 424

Gênero: Fantasia/Distopia


Por Paulo Vinicius F. dos Santos
               Originalmente publicado em: Ficções Humanas




Com uma escrita ágil e dinâmica, Victoria Aveyard nos apresenta um mundo de mentiras e traições onde um enorme grupo de pessoas é explorado por uma pequena elite com poderes especiais. Mas, logo esse jogo começa a virar.

Falem o que for de livros do gênero Young Adult, uma coisa que não podemos negar é que são livros extremamente rápidos de serem lidos. Uma linguagem fácil e um mundo que o leitor se acostuma rapidamente são muito atrativos. Claro que isso não significa que o livro é excepcional por causa disso, mas ajuda a trazer novos leitores. É imegável isso. A Rainha Vermelha pega esses elementos e nos apresenta uma história interessante em um mundo que deixa muito ainda a ser explorado.

Vivendo em Palafitas, a jovem Mare Barrow é uma pequena ladra que busca sustentar sua família. Mas, seu pai e sua mãe não aprovam as atitudes da filha. Eles são vermelhos, são pessoas comuns dominadas por um grupo formado por seres com poderes especiais chamados de prateados. Para os vermelhos, os prateados são como deuses na terra. Suas habilidades únicas os mantém como os tiranos absolutos desse mundo desigual. Norta, o lugar onde Mare mora está em guerra com Lakeland, o reino vizinho. E os vermelhos são a infantaria dispensável nesta guerra que se arrasta por várias décadas. Para repor o contingente que morre a cada batalha, todos os jovens vermelhos (homens ou mulheres) a partir dos 16 anos são obrigados a entrar para o exército. Mare já perdeu três irmãos para esta terrível guerra e ela tem poucas notícias deles vindo do campo de batalha. Gisa, sua irmã mais nova, é a esperança da família, pois ela sabe costurar lindos tecidos. Quando ela crescer, certamente se tornará uma costureira para os prateados. Mas, Mare será a próxima a ser convocada pelo exército. Apenas um ano a separa da convocação. Seu amigo Killorn a ajuda em suas aventuras pela cidade, auxiliando-a a roubar para que possam sobreviver mais um dia. Killorn é o aprendiz de um marinheiro e conseguirá sair da convocação. Porém, quando uma série de eventos improváveis acontecem na vida de Mare, ela se vê obrigada a invadir um palacete onde se encontram inúmeros prateados. E essa aventura a mudará para sempre. Porque dias depois dessa invasão, Mare será contratada como uma empregada dos prateados pelo príncipe do reino. Se não bastasse isso, Mare descobrirá que tem poderes também. Mas, algo não está certo: ela é vermelha e vermelhos não tem poderes. Descoberta pela corte, ela agora precisará integrar a família real, indo contra todas suas convicções. Por que Mare tem poderes? E mais importante do que isso: será ela capaz de sobreviver ao universo de intrigas e traições que parecem fazer parte da vida dos prateados?

Esse é um livro para quem gosta de intrigas e traições. Boa parte da ação se passa na corte dos prateados de Norta. Através de Mare vamos conhecendo as intrincadas relações de poder entre a corte e as Grandes Casas. A cada passo, a protagonista precisa tomar cuidado com as suas ações já que elas podem custar a sua vida. O fato de todos terem poderes bem distintos a coloca contra a parede. A narrativa é sufocante nesse sentido. Não existe nenhum momento de alívio. A tensão paira no ar o tempo todo. É como Julian diz em um momento: "Todos traem todos". Aqueles que parecem seus aliados hoje, podem ser seus inimigos mortais no dia seguinte. A autora foi muito bem sucedida em nos dar essa situação de constante insegurança. Só por esse motivo, o livro já se destaca de tantas outras narrativas YA semelhantes.

A narrativa é rápida e dinâmica. Rapidamente o leitor se acostuma com o universo literário proposto pela autora. Em pouco mais de cinquenta páginas já sabemos os termos, os medos, as consequências, tudo. Nao são todos os autores capazes de fazer isso. E não é porque o mundo de A Rainha Vermelha seja simples. Nada disso. Ela deixa vários mistérios no ar, vários lugares a serem explorados. Eu acho muito interessante quando um autor consegue sempre deixar o leitor curioso a respeito do seu universo. E ela cria isso. Só acho que algumas informações que ela passa são muito confusas e desencontradas em certos momentos. Talvez seja para confundir o leitor, mas eu não curti muito.

A ideia de colocar vermelhos contra prateados é interessante. É um clichê que a autora pegou e deu um uso que entregou bem à história. O cerne da questão é essa: seres poderosos dominando os mais fracos. E esses seres poderosos estão a tanto tempo no poder que não sabem mais do que os inferiores são capazes. Eu só achei que a história poderia ter sido épica sem a necessidade de colocar toda uma outra raça de seres poderosos. Poderia ser a luta daqueles sem poder contra aqueles com poder. Mare poderia ser apenas a única diferente. Isso daria algo épico porque seria a revolta das massas desprivilegiadas contra uma elite formada por poucos. Não havia a necessidade de criar um elemento X. Mas, okay... ainda é preciso explicar porque os prateados surgiram porque existem muitas interrogações na série. O lugar radioativo, a existência de tecnologia. Tudo dá a entender que havia uma civilização avançada antes da existência desse mundo atual. Talvez a autora esteja ambientando a série no nosso mundo, inserindo algum elemento pós-apocalíptico. Também seria uma surpresa interessante à trama.

Tudo acontece em primeira pessoa. Ou seja, a história é contada por Mare. Poderia ser algo enfadonho, mas a personagem cresce muito ao longo da história. Com a adaptação na corte em Norta, Mare vai pegando as piores características dos nobres. E ela não vai se dando conta disso. Quando ela percebe que se tornou tão manipuladora quanto aqueles que ela odeia, já é tarde demais e suas ações explodem nela. Toda a confiança que ela havia conquistado desaparece da noite para o dia. Aqui é preciso ressaltar o bom trabalho de personagens feito pela autora. Claro que, como em qualquer livro YA ela se utiliza de alguns clichês como o triângulo amoroso (que pode ser um quadrado), as inseguranças adolescentes da personagem que podem incomodar alguns leitores (como a mim). Mas, se você deixar essas características de lado, vai perceber a riqueza de construção de personagens. Você fica sabendo as características de cada um até porque a história precisa se focar nesse tipo de construção. Se eu estou lidando com intrigas na corte, eu preciso deslindar cada um dos personagens para que estes imponham sua forte presença na tomada de ações da protagonista. Quando o clímax é atingido, o que acontece a cada um dos personagens é importante para o leitor.

A autora discute um pouco a questão da manipulação da informação. Tudo é interpretável. Depende de como os outros estão enxergando uma cena. Os prateados conseguem se manter no poder porque passam aos vermelhos uma aura de deuses. São deuses super-poderosos, mesquinhos e dominadores. Se um vermelho cruza o caminho de um deles, a morte é certa. Só que Mare vai se dando conta de que os prateados não são tão "divinos" assim. Eles podem sangrar, eles possuem suas rixas internas e eles sentem medo quando encurralados. Quando ela se dá conta desse grupo de informações, ela passa a ter outra visão da corte. E ela quer passar isso para os vermelhos para que eles sejam capazes de enfrentar os prateados. O clímax do livro também é uma manipulação de informação. Se você não tem todo o contexto da cena, pensaria o mesmo do que o resto da cidade. Ninguém imaginaria as sutilezas daquilo que realmente aconteceu.

A Rainha Vermelha é um bom início de série. Tem seus clichês típicos do gênero e do público-alvo ao qual se dirige, mas consegue aproveitá-los bem e em seu próprio benefício. A escrita é muito ágil e o leitor é capaz de terminar sua leitura em um curto espaço de tempo simplesmente porque as páginas fluem. O enredo também é profundo e repleto de interpretações possíveis.

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